sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Ano novo. Contagem nova.


Com o animismo intensificado pelo acréscimo do poderio militar por parte dos países de todo o mundo, uma terceira guerra parece se tornar a cada dia mais inevitável, que Deus nos ajude – matéria de um jornal jogado a chão.

- É parece que o bicho vai pega, voces viram o que deu no jornal ontem? – Perguntou Getulio que estava sentado junto aos amigos sob uma cobertura da empresa na hora do almoço.
- Aquele negocio sobre estarem moqueado armas químicas em países de terceiro mundo?
- Isso mesmo, parece que o bicho vai pega e não vai demora.
- Deus o livre, já penso?
- É rapa e só quem se lasca é nóis, que nos fudemo aqui de segunda a sábado, os safados que tem grana sempre vão da um jeito de fugi.
- Deixa isso pros políticos, porque já tá na nossa hora.
O alarme avisando sobre o termino da hora do almoço soou, os amigos por sua vez já batiam o ponto.

*

- Vambora Kátia, voce assisti isso depois pô.
- Já está acabando, senta ai.
O rapaz que já tinha o capacete em mãos o depositou ao lado se sentando junto a namorada.
- Não sei que graça voce vê em assistir jornal.
- Não é graça Douglas, é importante, agora faz silencio vai falar sobre a treta entre os países.
- Ah se liga mina, isto tudo é mentira, o que os caras ia ganha declarando guerra?
- Shhiii...
A contra gosto o rapaz silenciou-se cruzando os braços.
- E mais uma tentativa de um acordo de paz não se concretizou, aumenta o risco da guerra política intensificar-se para uma guerra física, o presente Richard Button dos Estados Unidos anunciou não realizar pactos com fanáticos terroristas, critica realizada principalmente para os países do Oriente Médio...
- Ah já chega esses caras da TV só falam merda, vamos sair logo.
O rapaz desligou a TV e puxou a moça pelo braço.

*

- Conto com voce Ruan – disse a presidenta desligando o aparelho.
- A senhora confia realmente nele? – perguntou a assistente ao lado.
- Claro que não Erenice, ligue-me com o General Augusto.
No instante seguinte a assessora tinha o aparelho ligado em viva voz e seguia a presidenta para que esta pudesse manter contato com o general.
- General Augusto, não bobeie, quero que tenha os olhos voltados para nossos vizinhos, nunca se sabe.
- Sim senhora presidenta.

*

Não tinha duvida, o botão esperava o seu aperto, não mais toleraria afronta do país que se auto-intitula o dono do mundo, o dedo desceu apertando o botão, os foguetes foram lançados.

Fim (Literalmente).

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Desabafo Celeste


Se tu tudo pudesse ser
O que tu serias?
Seria sábio?Celebre?Celeste?
Se tu tudo pode fazer
O que tu farias
O amor?A vida?As pessoas?
Se tu tudo possuísse
Como tudo usaria?
Se tudo pudesse ver 
O que tu verias?
Caos? Guerras?Ganância?
Se tu tudo pudesse mudar
O que mudaria?
Tudo?Todos?Nada?
Se tudo voce pudesse dar
O que daria?
A vida?O sustento?A liberdade?
Se tu tudo pudesse corrigir
O que tu corrigirias?
Tudo?Todos?Nada?
Se tu tudo soubesse
O que faria?
Recomeçaria?
Se tu tudo pudesse, visse e soubesse
E nada adiantasse
O que faria?

Rafael Almeida

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Conseqüências


Uma trama nada oculta ocorria envolvendo todo o planeta, o povo em sua maioria envolta em cobiça, ignorância e descrença mergulhavam diretamente para o buraco.
A teia que vinha sendo delicadamente traçada não pela aranha, mas pelas moscas, estava finalmente em seu fim.
Os raios ultravioletas penetravam impiedosamente a face da Terra, terremotos abalavam o globo, furacões varriam civilizações, vulcões explodiam extinguindo povos e deformando a geografia conhecida, os animais avançavam recobrando seus territórios a muito roubado, contudo poucos eram os tinham os olhos abertos para a situação, menos ainda eram os que faziam alguma coisa, uma verdadeira e irremediável bomba relógio.

- Ah quanta merda falam estes cientistas, vivem enchendo o saco com este papo de fim do mundo, tá louco, parece que não têm outro assunto – disse o Thomas sentado sofá.
- Também acho querido!
- É papai o senhor está certo.
Palavras ditas, por uma família submersa por enchentes derivadas do acumulo de lixo nas valas da periferia de onde moravam.

*

- Ah que isso, que calor que nada estou até sentindo um friozinho.
- Uhum – respondeu o homem de branco.
- Este papo de buracos na camada de ozônio, nada a vê.
- Tá certo rapaz agora respire isto – disse o médico pondo o homem em estado de inconsciência.
- Quanta merda mesmo este papo de camada de ozônio não é? – disse o medico ao enfermeiro enquanto operava o homem que tinha o corpo tomado por um horrível câncer de pele.

*

- Ah querida olha só isto, que vento delicioso não acha?
- Sim, me sinto nas nuvens.
- É porque em breve chegaram lá seus idiotas – disse o vizinho que junto ao casal rodopiava em um monstruoso furacão.

*

-É quase como um banho turco, relaxe.
- Sei não, tô achando isto aqui meio apagado.
Ultimas palavras trocadas entre irmãos antes que seus corpos torrassem à aproximação do magma a pele.

*

- Tá louco, como exageram, até a montanha russa do play Center treme mais do que isto, o que são meros 10.1 na Escala Richter?
- Nada mesmo meu bom vizinho, olha ali aquele sendo arremessado pela janela não é o seu filho?
- Deve ser, só assim para este menino sair de casa.
Riram.

Achou graça? Acha que não existem pessoas assim? Olhe a volta e abra os olhos.

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Diário de Tuka

  
Foi amor a primeira vista, minha primeira lembrança é a de estar em seu colo, me levou para sua casa e me tratou com o maior carinho, não me lembro muito bem porque o tempo parece se encarregar de levar as lembranças assim como o vento se encarrega de levar um dente de leão, mas não me recordo de maus tratos por sua parte.
Deixava a casa quase todos os dias sempre antes do Sol nascer e voltava sempre quando o astro se punha, provavelmente saia para caçar só podia ser isto, para descanso tirava apenas um só dia numa serie de ir e vir de pôr de Sois, não devia ser bom caçador, pois trazia os louros da caçada apenas uma única vez a cada quatro Luas.
Verdade seja dita magoara-se com o fato de que ao crescer perdera o seu lugar na casa, sendo transferida para o quintal, assim como ele chamava, mas isto de maneira alguma havia diminuído o amor do homem por ela, todos os dias pela manhã e pela noite ele despendia alguns dos seus preciosos minutos para distrair-me, um verdadeiro amigo, alias o único que conheci em toda a minha vida.
Lembro-me certa feita quando já era não era mais filhote, que ele trouxe a nossa casa uma de sua espécie, de nome Aline se não me falha a memória, esta desde o inicio demonstrara o desafeto para comigo, dignando-se nem ao menos dirigir-me um único olhar, foi quando o homem mais pareceu indiferente a mim, ainda assim não descuidava de me manter alimentada e saudável, então em um destes muitos dias em que ele saia fiquei só com Aline, jovem terrível aquela, desceu as escadas e caminhou em minha direção, eu, estava presa a uma corrente, trazia a mão um suculento pedaço de carne, atirou a mim, sabia que de suas mãos nada de bom viria, mas fraca que só teria comido não fosse o homem que retornado voltara para buscar o que chamava de “chave do armário”, algo de natureza terrível poderia ter me acontecido, ele que sabia de minha inimizade com Aline tomou-me o pedaço de carne e subiu as escadas puxando-a pelo braço, após um longo tempo que não saberia medir, Aline nos deixou chorando para nunca mais voltar, novamente era só eu e Thiago, era este o nome dele.
Mais luas se passaram Thiago trazia agora com certa freqüência uma serie de frascos dentro de sacolas plásticas, parecia a cada dia mais abatido, mais apático, tossia bastante, já não éramos mais os mesmos, tanto eu quanto ele já não tínhamos mais o mesmo fôlego, brincávamos pouco, passávamos agora a maior parte do tempo recolhidos, eu em minha casinha e ele em seu quarto.
Há dias permaneci ali, só, abandonada, sem forças o bastante para abandonar a casinha, o que haveria acontecido com Thiago, a última vez que o vira foi quando este saiu em mais uma de suas caçadas, mas ao contrario de todas as outras vezes não havia voltado, luas e sois desprendiam-se do firmamento e nada, então um dia em que sua casa havia sido invadida por uma gama de pessoas desconhecidas, trajavam uma espécie de uniforme, lagrimas escorriam de seus rostos, eram homens, mulheres, jovens e velhos, nunca entendera aquilo, onde Thiago tinha se metido?
Estranhos homens saqueavam os pertences de Thiago, o que lhe restava agora como derradeiras companheiras eram somente a fome, a saudade e a solidão.

Tuka podia não saber ou nem mesmo entender, mas encontrar-se-ia com seu dono, morreu horas depois por tristeza e inanição.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Descobertas


"Os mistérios da vida às vezes têm um rápido desdobramento enquanto outros permaneceram ocultos pela eternidade."

- Querida você viu minha gravata?
- Tá no guarda-roupa.
- Brigado amor.
Fausto tinha pressa, não podia chegar atrasado, tinha uma importante reunião, tomaria café na empresa mesmo.
- Te amo querida, hoje eu acho que chego cedo.
- Eu também, só tenho que mostrar umas três casas hoje e depois já estou de volta, não vai tomar café?
- Tomo na empresa, to atrasado.
Foi à garagem e retirou seu conversível, belo modelo, ao dar a partida praguejou, uma daquelas torrentes repentinas principiava uma tempestade.
- Droga – disse acionando o teto solar por um botão – essa reunião eu não posso perder – deixou a garagem a fechando-a com seu controle junto ao molho de chaves.
Chuva forte, por esta os meteorologistas não contavam, fazia tempo que não via uma destas, por sorte o caminho até o serviço era bem asfaltado, menos mal, seguia cauteloso, tinha medo de guiar na chuva, o pára-brisa trabalhava sem parar.
Um estalo, som de algo se rachando, o que poderia ser?
Parte da estrada a sua frente estava cedendo, grandes rachaduras formavam circulo mal feito, o queixo quase caiu, era difícil de acreditar naquilo, deu ré.
- Nossa...
Em seguida tudo o que ouvia ou era som da pesada tempestade ou era entulho sendo levado ao fundo do imenso buraco que se abrira, tirou o aparelho comunicador do bolso e ligou para emergência, guiou de volta para casa.
- Amor voce não sabe o que aconteceu – disse assim que entrou em casa pela porta anexa a garagem.
- Sei, esta baita tempestade logo agora.
- Não, algo muito mais incrível, um imenso buraco se abriu na estrada.

*

Com o passar dos dias o fenômeno se tornou manchete de inúmeros jornais, tanto os impressos como os televisivos, mas o que de fato chamara a atenção dos cientistas de todo o globo, era o objeto encontrado no interior da cratera. O casal tinha TV ligada, quando a transmissão foi interrompida para uma surpreendente informação, era algo muito serio e importante, pois o alto chanceler não costumava aparecer em pronunciamentos.
- Povo da poderosa Splendona venho hoje a voces revelar o incrível resultado das intensas pesquisas realizadas no objeto encontrado a alguns dias em Narce, algo ao mesmo tempo maravilhoso e assustador, as pesquisas concluíram que aquela serie de metais retorcidos que fora resgatados do buraco era pertencente a um veiculo de locomoção milenar, com incrível semelhança a nossa tecnologia, foi possível ainda concluir através de uma espécie de registro de identificação retorcido junto ao veiculo que era de um lugar chamado São Paulo, analises realizadas também no chasis do automóvel revelou que era de um ano conhecido como 2010, tudo isto abre um incrível precedente na nossa historia e só nos mostra que temos muito a aprender, apartir de hoje a cada dia descobriremos mais e mais sobre este povo extinto e de incrível intelecto, muito obrigado e boa noite.

domingo, 26 de dezembro de 2010

Visão


A sirene entoava sua já conhecida melodia, entreva agora acelerada pela garagem do hospital, assim que o veiculo parou o homem que estava no banco do carona desceu e correu aos fundos do carro abrindo a traseira e dando passagem para outros dois de seus companheiros descerem com uma maca, atado a ela estava um homem, ao passarem pela entrada foram logo abordado por um medico.
- O que aconteceu com este paciente.
- Infarto.
Seguiram a passos rápidos até a sala de cirurgia.

*

- Ainda que eu caminhe pelo vale da sombra da morte eu não temerei – leu em uma plaquinha fincada ao chão onde dali se iniciava uma tortuosa estradinha construída em pequenos paralelepípedos.
Estava confuso, não se lembrava de ter chegado ali, decidiu seguir a estrada, olhou para os lados sinistrar arvores ressequidas com galhos tão longos que pareciam querer lhe agarrar, olhou para o céu, pesadas nuvens violentas caminhavam calmamente sob um negro véu ausente de estrelas, o que julgara ser a lua em uma segunda analise mais pareceu um recorte no manto noturno no qual revelava um fundo branco e brilhante.
Seus ouvidos foram tomados por um estranho grasnar que julgou vir do céu, olhou, estranhas aves esqueléticas sobrevoavam sua cabeça, santo Deus o que era aquilo?
As aves mergulharam em sua direção, passou a correr, o que era aquilo?O que estava acontecendo? Escutava o som de ossos se estraçalharem as suas costas, estaria ficando louco?
Viu uma casinha mais a frente, havia alguém lá, da janela dava para ver uma fraca iluminação, chegou, bateu a porta, tinha os olhos fixos ao céu na procura de mais uma daquelas esdrúxulas aves, distraído não notou a porta sendo suavemente aberta, uma mão surgida do interior da casa então o puxou.
- Ei... – disse se virando – Ahhh o que isto? Quem é voce?
Via a sua frente um sinistro velhote com dois alicates em mãos, estes por sua vez vinha anexo a grossos cabos ligados a um velho gerador.
- Deus do céu.
Esmurrou a porta com tamanha força que está cedeu indo ao chão, deixou a casinha correndo, voltou à estradinha sem coragem de olhar para trás, tão somente recobrou a coragem quando estava longe o bastante para não mais ver o macabro casebre, tropeçou e caiu se molhando por inteiro – Droga que azar – levantou-se, então pode ver no que havia tropeçado, era uma fonte, nela também tinha uma placa.
- Fonte das lembranças... Pif, que nome mais idiota para uma fonte – decidiu retomar a caminhada, olhou uma ultima vez para a fonte – o que era aquilo? – se via no sitio de seu avô quando tinha apenas cinco anos, agora como se águas tivessem sido atingida por uma pedra o cenário mudara, era sua festa de casamento, novamente as águas tornaram-se inquietas, era o nascimento de seu primeiro filho.
Sentiu uma mão tocar-lhe o ombro, o sangue gelou nas veias, olhou para trás, era novamente aquele louco com os alicates, o repeliu o empurrando com os braços, voltou a correr, correu, correu...
A frente agora via um porto seguro, uma luz, a frente via a mãe de braços abertos, ao fundo via também uma forte luz branca, a suas costas o velhote ainda o perseguia, não iria o pegar, correu mais, mais, chegou...

*

- Hora da morte... – disse o médico olhando para o relógio preso a parede – nove e doze.

sábado, 25 de dezembro de 2010

Batalhas da vida


- Voce não pode fazer isto, nos sempre contamos com voce.
- E eu, com quem eu conto?
- Voce não está mostrando a gratidão que deveria ter.
- Não é isso, simplesmente eu quero fazer o que desejo, e isto não inclui ser advogada.
- Filha voce não está nos levando em consideração.
Silvia não tinha mais paciência para aquela discussão.
- Mãe tô ocupada, te ligo depois tá, beijo, tchau.
- Esper...
Desligou.
Apesar da oposição familiar sentia-se livre de um peso tremendo, era filha única de uma família pertencente a uma longa linhagem de advogados, juízes e desembargadores, como o seu pai.
Desde de pequena fora incitada a arte dos direitos, sem escolha era cada vez mais empurrada para uma carreira indesejada, não que odiasse a profissão de advogada, mas o que sempre ambicionara era ser lutadora de boxe, sabia o quão diferente e estranho era aquilo, principalmente para os pais, mas tinha verdadeira adoração pelo pugilismo, praticava sempre que podia, evitava o uso do carro para chegar à academia, sempre que possível preferia correr, fazia aulas de boxe desde a faculdade de direito claro sempre em segredo, até então tinha medo de abrir o jogo para a família, tinha medo da reação dos pais, estava certa com relação ao temor, seu celular não descansava um só minuto desde o momento em que havia contado sua vontade, os pais a chamaram de louca, “ah voce vai trocar uma solida carreira por besteira”... Podia estar errada, podia até estar louca, mas realizaria o seu sonho, seria hoje sua primeira luta “profissional”, estava tensa, ansiosa.
TIM – sonorizou o elevador indicando o andar desejado e abrindo a porta.
Lembrava-se agora de como tinha conseguido a coragem necessária para realizar seu sonho, tudo tinha começado a mais ou menos um ano, foi nesta época que passou a treinar com mais determinação foi nesta época também que conheceu Roberto, o rapaz da água, sim não era ele o treinador ou mesmo um aluno, simplesmente o cara da água, franzino e tímido, bem diferente dos fortões que freqüenta o circuito das academias, contudo tinha sido ele a sua inspiração, conversavam por horas, “sua felicidade não pode estar na posse de outros que não voce” dizia ele, não chegaram a namorar ao contrario do que muitos ali na academia pudessem achar, Roberto desaparecera do dia para a noite, mobilizara a policia e grupos de busca na tentativa de encontrá-lo, tinha como ponto de honra realizar seus sonhos, não só por ela como por ele também, quando o amigo aparecesse mostrar-lhe-ia o cinturão de campeã regional.
O campeonato que diferentemente do que se via nos jornais estava muito bem organizado, tudo graças a um patrocinador de renome, uma daquelas marcas famosas de energéticos, o torneio seria realizado no andar superior de um shopping de grande circulação, estava agora no vestiário reservado para as pugilistas, envolvia suas mãos com as faixas que antecedem a colocação da luva, de lá dava para ouvir o locutor anunciar as lutas da noite, algumas das participantes eram nomes famosos do circuito de boxe, sentia um desconforto intestinal comum aos ansiosos.
As lutas tinham começado, aguardava sentada sua vez, por vontade preferiu não saber por antecipação o nome de sua adversária.
- Agora veremos a luta entre a estreante Silvia Bianchi contra a experiente e atual campeã regional Samara Ribeiro.
Sentiu o coração disparar, de todas as adversárias, aquela certamente era a pior, droga não queria perder logo de cara, lembrou-se do amigo, fosse como fosse iria sem medo.
Silvia caminhava em direção ao ringue, olhou a sua volta, muito mais pessoas do que esperava, sua oponente já a aguardava sobre a arena, subiu.
- Boa sorte – disse-lhe o treinador entregando o protetor bucal.
- Vamos primeiro aos comprimentos – disse o locutor.
Ambas tinham a mãos esticadas e em contato.
- Comecem.
Silvia preferiu ganhar distancia para analisar a concorrente, sabia que se fosse afoita poderia perder ainda no primeiro round, pena que sua adversária não tinha a mesma intenção, avançava com ferocidade em sua direção, desviou uma, duas, na terceira sentiu o punho da outra contra o estomago, arfou de dor, cambaleou pra trás na tentativa de recobrar-se.
- Cuidado – disse o treinador.
Entendeu tarde demais o aviso, mais uma vez o punho de Samara a atingia, desta vez na cabeça, estava zonza e desorientada, o maldito gongo não tocava nunca? Deste jeito seria pulverizada.
Lembrou-se do amigo, sempre incentivador e companheiro, da família, críticos e mordazes, tudo aquilo lhe servia de combustível para continuar, não podia cair...
Mas caiu.

Moral da história?

Nem todos que tentam conseguem, mas os que não tentam nunca conseguirão.

Entre os que tentam poucos conseguem, porém entre os que não tentam todos falham.

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Espírito Natalino


- Opa, vamos entrar – disse o homem que acabava de girar a chave, abrindo o portão.
- E ai Carlão como vai? Feliz Natal – disse um amigo lhe dando um tapa no ombro.
- Pra você também Joca, entra aí – disse fechando o portão assim que o amigo já havia passado – tá todo mundo ai, o André, o Marcio, a Ana...
Subiram um lance de escadas que levava a laje, onde estava acontecendo à festa, como eram grandes amigos Joca não fez cerimônias, caminhou até a churrasqueira que era pilotada pelo seu também amigo André.
- Desce uma maminha no capricho ai Toco – disse para o amigo que não passava de um metro e sessenta.
André até então atento as carnes se virou para cumprimentar o amigo.
- Pô, achei que você não vinha mais.
- Ah, tava trampado até agora pouco, metalúrgica é foda.
- Vixi, nem me fala...
A festa estava animada, recheada de amigos e familiares, o sambinha corria solto, tinha uma latinha de cerveja em mãos, do jeito que gostava, queria era mais se esbaldar, afinal também era filho de Deus, trabalhava feito louco de segunda a sábado, fazendo um horário super apertado como cobrador, tinha o direito de ir à forra, vira e meche era parabenizado pela organização da festinha, caminhou até a churrasqueira.
- Só na lingüiça?
André dignou-se somente a lançar um sorriso sem graça.
A festa avançou a noite, Carlos já havia bebido e comida o suficiente para uma vida, passava da meia noite, só restavam na laje ele, a esposa e amigo, o carvão despedia-se liberando seus últimos fios de fumaça.
- Grande festa Carlão – disse Joca com as mãos no ombro do amigo – vô nessa.
- Tá cedo – disse Carlos que usara este velho trato educacional durante toda a noite com seus convidados.
- É por isso mesmo que to indo, tá cedo, daqui a pouco já tá clareando – disse rindo.
- Tá certo – diz com a mão ao peito, suava excessivamente, a madrugada nem estava assim tão quente.
- Cê tá bem?
- Tô sim é só uma palpitação...ai...ah... - com a mão pressionada ao peito numa vã tentativa de controlar a dor Carlos ia de modo lento ao chão, tinha os olhos arregalados tanto pela pressão cardíaca quanto pelo espanto, nem sua esposa, nem seu melhor amigo o amparavam, pelo contrário olhavam como se saboreassem a funesta cena, porque aquilo? O que havia feito para eles? A dor queimava-lhe o peito, tombou cerrando os olhos.

*

- Vem, este mundo não o pertence mais.
Que voz era aquela? Era uma voz familiar, tinha certeza disto, abriu os olhos, estes por sua vez quase lhe saltaram da face.
A voz que ouvia de fato era conhecida, era a voz de seu pai, o pai que havia ajudado a enterrar há três anos, como aquilo era possível? O que ele próprio fazia ali, caído no chão? A mente parecia ocupada por um grande vazio, conhecia o cenário, era a laje de sua casa, sempre organizava um churrasquinho nos feriados, o que seu pai estava fazendo ali? Porque estava tudo preto e branco? Natal, era isso, estava comemorando o natal.
- Você estava. – disse o homem que parecia em muito consigo, excetuando os inevitáveis traços da idade.
- Como assim estava? O que é tudo isso? Estou sonhando não é mesmo?
- Não, não está.
- Eu não posso morrer.
O homem que em tudo parecia seu falecido pai deixou escapar um esgar de sorriso.
- O que lhe confere tal direito?
- Muitos são os que me querem bem.
- Site três.
- Fácil, minha esposa, o André e o Joca.
- Sério? Vamos a eles então.
Como se tivesse um véu lançado à cabeça, ao término da frase, da funesta imagem de seu pai Carlos, teve a visão oculta pelo breu.
- Então, foi tão ruim assim a festa?
- Pior, aquele cara nunca muda, sempre o mesmo gorducho idiota com as mesmas piadinhas sem graça.
Quando o véu que tampava-lhe os olhos foi liberado Carlos desejou que a venda os cobrisse novamente, tão duras palavras vinha de seu amigo André em conversa com a mulher.
- Grandes amigos hein? – escarneceu a macabra caricatura de seu pai.
- Me tire daqui, por favor.
- Tá certo, próxima parada.
Ouvia cálidos gemidos e som rangente de uma cama, o que seria aquilo? Desta vez com a venda lhe liberou a visão, o que via foi ainda pior,
- Joca...Eliza...juntos...na cama – murmurou o homem com o ódio cozinhando em mente – desgraçados eu vou matá-los – Carlos atirou-se sem sucesso na cama, antes mesmo que percebesse estava novamente em pé ao lado do funesto companheiro de jornada.
- Vamos? – indagou o companheiro
Carlos parecia deprimido, atônito, chocado, não acreditava em tudo aquilo, não merecia...
- Não cabe a você julgar o que foi ou não justo em sua vida, cabe tão somente a você o desejo de vir ou não comigo.
- Tudo bem podemos ir, não tem mais nada aqui para mim, mas me diz só mais uma coisa.
- O quê?
- Quem é você?
O homem deixou o tênue véu que mascarava sua real identidade cair, sua face era encoberta por um pesado capuz anexo a um sobretudo preto, tinha seguro a mão direita uma afiada foice de cabo longo.
– Sou o espírito do natal – sorriu.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010


Finalmente havia chegado em casa, estava destruído, não sabia se voltaria ao trabalho no dia seguinte, estava farto daquilo.
Tirou os sapatos e largou o corpo no sofá.
Controle em mãos começou a zapear os canais...passou por propagandas de carros, entrevista com alguma nova celebridade recém saída de algum reality show, clipes de bandas gringas e parou no jornal da Globo, boa noticia para variar “-...começa a ser executado o resgate dos mineiros soterrados no dia nove de setembro pelo desabamento de uma mina de carvão no Chile, o resgate que estava previsto para ser realizado apenas no natal, foi iniciado com dois meses e meio de antecedência...”
Assustou-se com um barulho na janela da cozinha. Levantou pra ver o que era.
- Então voce estava na rua não é mesmo Fígaro? - disse o medico.
O som tinha sido da chegada de seu gato.
- O que voce andou aprontando hein?
Agora o pequeno bichano brincava com algo no chão da cozinha.
- O que é isto ai?
Cleber pegou do chão entre as garras de seu mascote algo que parecia ser um cartão, havia algo escrito, foi até a sala em busca de seus óculos que havia descansado em algum lugar, achou, ligou o abajur e aproximou o cartão dos olhos, leu em voz alta:
- “Salve o mundo. Seja um milagre. Descubra a verdade.”
Virou o cartão. Um numero de telefone.
- Do que se trata isto Fígaro? Por onde voce andou?
Fez um estante de silêncio com se esperasse uma resposta do animal.
- Esta Zenaide nunca muda, sempre tentando me levar para assistir ao culto na igreja que freqüenta, e agora até esta deixando bilhetinhos. – Comentou o Medico lembrando-se de sua empregada.
Queria acreditar que a religião era a chave para a solução de seus problemas, varias vezes já havia rezado, não por ele, mas pelas pessoas desenganadas, nunca obteve resposta, tinha deixado de acreditar.
Canal a canal, palavra a palavra a frase foi se formando automaticamente em alto e bom som nas mais variadas vozes:
- Se você... deixou... de... acreditar... ligue agora mesmo não perca tempo... salve... o mundo... seja... um milagre... descubra... a verdade.
Suor frio, palpitação, principio de infarto. Tinha acabado de ver sua TV zapeando sozinha formando uma frase completa e ainda com os dizeres daquele cartãozinho, e ainda sim fazia uma análise automática de si.
Caiu do sofá. Acordou.
- Meu Deus que pesadelo. Respirou aliviado o medico.
Olhou para a TV, ligada, fora do ar. Olhou ao redor, tudo okay.
- Definitivamente este foi o sonho mais esquisito que já tive. –... Ligue agora mesmo salve o mundo... – Sussurrou Cleber lembrando-se do que havia sonhado, pensou no amigo.
Apanhou o cartão e o virou, ali estava o numero. Digitou. Um único toque.
- Alo. Disse uma voz masculina.
- Alo, é sobre o cartão.
- Eu sei, muito prazer meu nome é Lucas.
- Eu gostaria de saber do que se trata este cartão, este numero é de alguma igreja ou algo assim?
- Não, não tem haver com uma religião. Tem haver com a verdade oculta por traz de todas, a verdade que se perdeu por anos de partilhas religiosas.
- Desculpe amigo, não entendi muito bem o que voce quis dizer.
- Quero dizer que se o seu desejo é ajudar o próximo, primeiro deve aprender a juntar este quebra cabeça.
- O que sabe ao meu respeito?
- Sei que daria sua vida para salvar a de seus pacientes.
- Voce não sabe nada da minha vida.
- Sei que se sente como se partisse junto com cada pessoa que perde, sei também que nunca deixou de procurar por conhecimento, para que pudesse nunca mais ter que dizer a uma pessoa que ela esta para morrer ou para nunca mais perder um paciente numa mesa de cirurgia.
Lagrimas. Sentia todo o peso das mortes em suas costas.
- Peço que me deixe te mostrar a solução para a sua angustia.
- E como vai fazer isto?- disse Cleber com a voz tão tremula e soluçante, que chegou a duvidar se o tal Lucas entenderia.
- Nunca mais terá que ver ninguém partir por ineficiência medica.
- Como?
- Com o estudo certo voce será capaz de curar as pessoas.
Aquilo era loucura, não podia estar caindo no papo de um cara que nem conhecia. Mas queria...precisava acreditar.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Entrega


Mais uma porta, mais uma tentativa. Uma ultima e desesperada tentativa de dar certo. Caso dessa vez não obtivesse sucesso desistiria da droga desse emprego. Que idéia. Nunca fora bom com as palavras. Vendedor. Chega a ser irônico uma pessoa que sempre foi levado por idéias alheias agora tentando levar outras pessoas no papo, mas a pior de todas as idéias concerteza foi a de comprar vários exemplares desta maldita enciclopédia para revender, só ele era burro para cair nessa história – Não, pode comprar, lhe garanto é sucesso na certa, todos querem, elas se vendem sozinhas – murmurou lembrando-se das palavras do amigo que lhe empurrara as porcarias das enciclopédias. Amigo? Amigo nada, que tipo de amigo daria uma idéia dessas? Queria enfiar um murro no nariz do safado. Se a idéia fosse boa por que ele mesmo não estava revendendo enciclopédias de porta em porta? Sabia a resposta, ele não estava fazendo isso porque era mais esperto, esperto o bastante para empurrar essa porcaria pra outro.
Era hora. Frente a frente com um exemplar do objeto que ele mais vira e odiava naquele ano. Lembrou-se das portas. Todas elas se fechando na sua cara uma a uma. Nunca obtivera muito retorno, no maximo conseguiu vender dez exemplares e nem a própria mãe comprou. O dinheiro das vendas, que já era pouco, mais o que ele já tinha antes foram usados pra pagar algumas contas, comida e passagem nas infrutíferas tentativas de conseguir vender mais alguns exemplares.

- Quase um ano e pouquíssimas vendas - pensava ele enquanto tocava a campainha.

Era agora ou nunca. Vitima à vista, quer dizer, cliente. Este era alvo fácil, tinha cara daqueles que nunca dizem não, daqueles que eram chamados de tolos, otários. Assim como ele. Agora vai.

- Senhor gostaria de...

- Não.

E novamente a cena que se repetira incessantemente durante aquele ano aconteceu pela enésima vez. Porta na cara.

Exausto, cansado, irritado, gritou:

- Chega, eu desisto, não dá mais, sou oficialmente um fracassado, definitivamente não falta mais nada.

Cabisbaixo e mais desanimado do que nunca, empurra seu carrinho abarrotado de exemplares rumo sua casa.

Aproximando de sua casa avista um homem. Gordo. Careca. Quem seria aquele? Meu Deus era só o que faltava, não podia ser ele, mas era...

- Então Marcelo, não dá mais ou paga pelo menos o aluguel desse mês ou vai pra rua ainda hoje.

- Ma... mas senhor Luis não tenho como, os negócios não estão indo muito bem.

- Não me importo cara ou paga ou desocupa.

- Mas se o senhor tiver um pouco de paciência...

- Paciência o caralho Marcelo, pra mim chega, voce não passa de um cagão falido. Amanhã quero a casa desocupada. Quanto à chave, deixe-a na caixa do correio.

Agora sim, era comprovadamente o cara mais fudido de todos, o que fizera para merecer isso? Nunca fora bom para todos? Sempre ajudando como possível? Era isso que ele recebia em troca? Era esse o fundo do poço? Terminaria assim?

Não, não permitiria isso. Ligaria pra mãe. Voltaria pra casa. Reprogramaria sua vida. Não acabaria pedindo moedas pra desconhecidos pra comprar pão, claro que à própria mãe era exceção.

Por sorte, se assim pudesse chamar, tudo o que tinha no quarto alugado, com exceção do carrinho de enciclopédia, cabia no seu velho mochilão.

...

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Dureza de Vida


Barulho irritante e alto. Cabeça latejando. Saco havia esquecido novamente de trocar a droga do toque do despertador, qualquer dia quebraria ele só de raiva.
Cinco horas da manhã, pelo amor de Deus ninguém deveria ter que acordar àquela hora, queria poder acordar quando não tivesse mais sono ou quando lhe desse na telha. Queria acreditar que podia viver dos seus sonhos, que podia ganhar dinheiro trabalhando com o que gosta. Ser escritor era isso que queria. Queria muitas coisas, mas concerteza não queria trabalhar pegando no pesado, ouvindo comida de rabo do chefe, batendo cartão todo dia, comendo marmita requentada, ouvindo picuinha de colegas de trabalho, não tinha se matado de estudar durante onze anos para terminar os seus dias colocando ruela e borracha no parafuso.
Tinha vontade de chegar ao serviço e bem no meio do pátio, na hora do almoço com todos reunidos, subir na mesa e pedir a atenção de todos e quando todos estivessem voltados para ele surtar, quebrar tudo, ficar louco, falar tudo que queria na cara de todos, vomitar todas as injustiças que todos vêem, mas ninguém fala pra não perder o emprego, dizer como se sente mal por ter se esforçado ao maximo pra ser o funcionário ideal trazendo idéias pra melhorar a produção, sendo sempre o primeiro a chegar e o ultimo a sair, se mostrando sempre disponível, bem humorado, proativo e ver que na primeira oportunidade de promoção escolheram o Anderson, não porque era o mais brilhante, se fosse isso entenderia, mas porque era o mais influente, afinal era cunhado do diretor administrativo...
Queria xingar, brigar, abrir os olhos dos que estavam apáticos e dizer que isso não estava certo, que eles não podiam deixar isso acontecer...queria muito mas não podia... E não podia pelo mesmo motivo que seus colegas de serviço se calavam e fechavam os olhos para essa injustiça, não podia perder o emprego.
Se perdesse mais esse emprego não agüentaria a enchessão de saco da sogra. Amava a esposa, mas odiava a sogra. Ela queria que sua filha se casasse com alguém que lhe desse um futuro melhor, fosse bem empregado, ganhasse um salário gordo, tivesse faculdade, carro do ano, casa própria e não um sonhador metido a revolucionário como era Roberto. Então iria agüentar calado, como um bom funcionário tinha de ser, uma marionete nas mãos do patrão que só visava a mais valia.
Levantou. Tomou banho. Se vestiu. Pegou a marmita. Beijou a esposa e foi pro martírio... Não era vagabundo. Não mesmo. Só queria que o mundo fosse mais justo, que as pessoas fossem recompensadas pelo seu esforço, pela sua garra e pudessem trabalhar construindo seus sonhos. O mundo podia ser assim. Mas sabia que não era.
Pelo menos podia dormir mais meia hora na lotação, sempre tinha pelo menos um lugar vazio naquela hora. Sono geral. Comum àquela hora. Garoa fina pra variar, senão não seria São Paulo. Neblina impedindo a visão mais adiante.
- Vai fazer um calor danado hoje, sempre que tem neblina de manhã a tarde faz calor... - comentou um homem com a pessoa ao seu lado.
Sono. Fechou os olhos.
Busina. Gritos. Abriu os olhos e logo quis fechá-los. Só podia ser um sonho. Quem dera que fosse um sonho, tava mais pra pesadelo...
- NÃO AHHH...
Estrondo. Ferro retorcendo. Gritos. Sangue. Gemidos.
- Me ajuda socorro... Ecoava em seus ouvidos os gemidos dos sobreviventes.
Horror, era o que sentia, aquilo não podia estar acontecendo, só podia ser um pesadelo. Queria ajudar as pessoas, era o que ele mais queria, mas não podia estava preso entre as ferragens. Precisava de ajuda. Lembrou da esposa. Lagrimas. Queria acordar daquele inferno. Mas não iria...

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

No meio do caminho


Camila era uma mulher forte, alegre e cheia de vida, cheia de vida até o dia em que foi esvaziada, o termo exato era morta, morta por uma fera, ainda tinha a impressão salva em seu corpo espectral, nem morta se esqueceria daquela cena, uma fera imensa e peludo, focinho proeminente e diversos dentes na boca, não fosse a fera possuir olhos que chamuscavam como brasas revolvidas por um galho infernal poderia até ter crido que fora morta por um cachorro dinamarquês excessivamente peludo e maléfico, mas não era o caso, agora vendo a cena de um ângulo único observava a fera tomar forma humana e trajar-se com roupas de couro preta que até então estavam ocultas no interior de uma mochila largada lateralmente ao latão de lixo, a fera agora era um homem negro, forte e careca, passou a persegui-lo de um jeito único até onde era de seu conhecimento, ao invés de passo a passo perseguia seu algoz, que parecia não vê-la, flutuando rente ao chão, lembranças do inicio daquele dia invadiam-lhe a mente, vinham como flash, como fotos, uma a uma, lembrava ter acordado, estava atrasada, tomou um banho rápido e se vestiu correndo, ao chegar no serviço teve um dia de cão, era balconista de uma famosa loja de fast food, lembrava ainda que ao fim do dia, semelhante a uma cereja podre em cima de um bolo de vermes fora despedida, mas só ao fim do dia, miseráveis fosse a intenção mandarem-me embora por que não mandaram logo cedo, se assim fosse podia estar viva agora ao invés de vitima por uma criatura que nem ao menos habitava o seu imaginário, sempre achara ridículo aquele papo de criaturas ocultas nas trevas, quanto mais aquela, um lobisomem, sempre escarnecera o irmão mais nova, extremamente fissurado nessas paradas, enquanto era atacada pelas lembranças o seu corpo quase que de modo magnético seguia a fera, queria retaliação, iria a forra com o meu maldito carrasco, decidiu avançar, não esperaria mais, alcançou as costas do homem e lhe desferiu um murro, para nem tanto espanto assim lembrar que não passava de um espírito e que de acordo com as estórias era incapaz de fazer algum mal a fera, iria então tentar algo diferente, tentou anexar o seu espírito ao corpo de seu assassino, de igual modo em vão, mas não de igual modo doloroso, quando seu espectro penetrara metade da carne da criatura fora repelida sentindo espasmos semelhantes aos de eletrocução, tombou por um estante dando vantagem ao mostro disfarçado de gente, a sorte era que o pretensioso caminhava calmamente como um civil comum, notou ainda que mesmo diante da queda seu corpo de maneira nenhuma ligava-se a terra, mantinha-se poucos milímetros acima do contato, ao recobrar-se do choque observou a criatura dobrando uma rua a esquerda correu em sua direção, em instantes estava novamente em seu encalço, o ódio cozinha em seu espírito, daria um fim naquele maldito, ele seguia agora claramente em direção a um funesto casarão, pessoas de modo desavisado caminhavam próximo ao monstro, coitados nem ao menos desconfiavam que poderiam ser a próxima vitima, não deixaria aquele verme fazer isto com mais ninguém, presa em pensamentos nem ao menos notou a viatura que vinha em sua direção, posto que ainda cruzava a rua,  gritou, possuía ainda reflexo dos vivos, mesmo morta ainda temia a morte, sentiu-se estranha muito estranha, não pelo fato do carro ter-lhe atravessado, sentia-se estranha por que tinha um volante em mãos e braços que os seguravam, juntamente com todo um corpo, era agora o piloto policial, freou bruscamente o veiculo.
- O que foi Cardoso, tá loco porra – disse-lhe o homem que estava ao lado no banco do carona.
Abriu a porta e desceu, passou a correr na direção do homem que já adentrava os portões do casarão.
- Ei assassino...
O homem vestido com pesadas roupas de couro preto voltou instintivamente o rosto para trás, Camila então o alvejou seguidamente até o esgotamento das balas, o homem tombou.
...