sábado, 25 de dezembro de 2010

Batalhas da vida


- Voce não pode fazer isto, nos sempre contamos com voce.
- E eu, com quem eu conto?
- Voce não está mostrando a gratidão que deveria ter.
- Não é isso, simplesmente eu quero fazer o que desejo, e isto não inclui ser advogada.
- Filha voce não está nos levando em consideração.
Silvia não tinha mais paciência para aquela discussão.
- Mãe tô ocupada, te ligo depois tá, beijo, tchau.
- Esper...
Desligou.
Apesar da oposição familiar sentia-se livre de um peso tremendo, era filha única de uma família pertencente a uma longa linhagem de advogados, juízes e desembargadores, como o seu pai.
Desde de pequena fora incitada a arte dos direitos, sem escolha era cada vez mais empurrada para uma carreira indesejada, não que odiasse a profissão de advogada, mas o que sempre ambicionara era ser lutadora de boxe, sabia o quão diferente e estranho era aquilo, principalmente para os pais, mas tinha verdadeira adoração pelo pugilismo, praticava sempre que podia, evitava o uso do carro para chegar à academia, sempre que possível preferia correr, fazia aulas de boxe desde a faculdade de direito claro sempre em segredo, até então tinha medo de abrir o jogo para a família, tinha medo da reação dos pais, estava certa com relação ao temor, seu celular não descansava um só minuto desde o momento em que havia contado sua vontade, os pais a chamaram de louca, “ah voce vai trocar uma solida carreira por besteira”... Podia estar errada, podia até estar louca, mas realizaria o seu sonho, seria hoje sua primeira luta “profissional”, estava tensa, ansiosa.
TIM – sonorizou o elevador indicando o andar desejado e abrindo a porta.
Lembrava-se agora de como tinha conseguido a coragem necessária para realizar seu sonho, tudo tinha começado a mais ou menos um ano, foi nesta época que passou a treinar com mais determinação foi nesta época também que conheceu Roberto, o rapaz da água, sim não era ele o treinador ou mesmo um aluno, simplesmente o cara da água, franzino e tímido, bem diferente dos fortões que freqüenta o circuito das academias, contudo tinha sido ele a sua inspiração, conversavam por horas, “sua felicidade não pode estar na posse de outros que não voce” dizia ele, não chegaram a namorar ao contrario do que muitos ali na academia pudessem achar, Roberto desaparecera do dia para a noite, mobilizara a policia e grupos de busca na tentativa de encontrá-lo, tinha como ponto de honra realizar seus sonhos, não só por ela como por ele também, quando o amigo aparecesse mostrar-lhe-ia o cinturão de campeã regional.
O campeonato que diferentemente do que se via nos jornais estava muito bem organizado, tudo graças a um patrocinador de renome, uma daquelas marcas famosas de energéticos, o torneio seria realizado no andar superior de um shopping de grande circulação, estava agora no vestiário reservado para as pugilistas, envolvia suas mãos com as faixas que antecedem a colocação da luva, de lá dava para ouvir o locutor anunciar as lutas da noite, algumas das participantes eram nomes famosos do circuito de boxe, sentia um desconforto intestinal comum aos ansiosos.
As lutas tinham começado, aguardava sentada sua vez, por vontade preferiu não saber por antecipação o nome de sua adversária.
- Agora veremos a luta entre a estreante Silvia Bianchi contra a experiente e atual campeã regional Samara Ribeiro.
Sentiu o coração disparar, de todas as adversárias, aquela certamente era a pior, droga não queria perder logo de cara, lembrou-se do amigo, fosse como fosse iria sem medo.
Silvia caminhava em direção ao ringue, olhou a sua volta, muito mais pessoas do que esperava, sua oponente já a aguardava sobre a arena, subiu.
- Boa sorte – disse-lhe o treinador entregando o protetor bucal.
- Vamos primeiro aos comprimentos – disse o locutor.
Ambas tinham a mãos esticadas e em contato.
- Comecem.
Silvia preferiu ganhar distancia para analisar a concorrente, sabia que se fosse afoita poderia perder ainda no primeiro round, pena que sua adversária não tinha a mesma intenção, avançava com ferocidade em sua direção, desviou uma, duas, na terceira sentiu o punho da outra contra o estomago, arfou de dor, cambaleou pra trás na tentativa de recobrar-se.
- Cuidado – disse o treinador.
Entendeu tarde demais o aviso, mais uma vez o punho de Samara a atingia, desta vez na cabeça, estava zonza e desorientada, o maldito gongo não tocava nunca? Deste jeito seria pulverizada.
Lembrou-se do amigo, sempre incentivador e companheiro, da família, críticos e mordazes, tudo aquilo lhe servia de combustível para continuar, não podia cair...
Mas caiu.

Moral da história?

Nem todos que tentam conseguem, mas os que não tentam nunca conseguirão.

Entre os que tentam poucos conseguem, porém entre os que não tentam todos falham.

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